quinta-feira, 23 de abril de 2009

Tempo fechado, Bruce Sterling


Acabei de ler a distopia ecológica Tempo fechado (Heavy Weather, 1994), do escritor texano Bruce Sterling, traduzida para o português por Carlos Angelo e publicada em 2008 pela Devir Editorial. Bruce Sterling teve publicado anteriormente no Brasil o romance Piratas de dados (Islands in the net, 1988) pela editora Aleph, além de alguns contos. Foi um dos baluartes de um movimento estético e conceitual da FC americana que ficou conhecido como cyberpunk. O estilo de Sterling é arejado, muito agradável de ler, sem afetações e bastante interessante no que se refere aos temas propostos.
Tempo fechado conta a história dos irmão Alejandro (Alex) e Juanita (Jane), herdeiros de uma enorme fortuna mas que tiveram o azar de ter um pai controlador e nascer num mundo em processo de demolição por conta de incontornáveis prejuizos ambientais causados pela ação humana desregrada. As fronteiras internacionais praticamente não existem para eles, que vivem de uma forma selvagem, deslocando-se ilegalmente, escondendo-se do pai e um do outro. No início da história, Alex - que sofre de bronquite crônica aguda - está em tratamento de saúde numa clínica ilegal no México, gastando os tubos com medicamentos experimentais. Ele passa a maior parte do tempo drogado, mas Jane tem outros planos para o irmão. Com um equipamento de espionagem sofisticado, ela invade a clínica, resgata Alex e o carrega, num veículo todo-terreno que mais parece um robô, até uma região no meio-oeste americano onde há grande incidência de tornados - que têm sido cada vez mais violentos depois que as alterações climáticas interferiram no equilíbrio ambiental do mundo inteiro. Jane faz parte da Trupe Intempestiva, uma equipe de especialistas em tornados, cujo líder, Jerry, previu através de ensaios matemáticos a formação de um super-tornado que pode devastar toda a região e alterar definitivamente o clima global. Ninguém acredita que esse tornado possa acontecer, mas toda a Trupe espera que sim e se prepara caçando e estudando tornados menores. As previsões de Jerry indicam que o fenômeno deve acontecer dentro de alguma semanas e por isso todos estão muito ansiosos. Aos poucos entendemos que Jane arriscou-se a tirando o irmão da clínica mafiosa porque, no final das contas, estava completamente falida e esperava que o irmão pudesse suprir as necessidades financeiras da Trupe com a sua parte da herança familiar. Mas Alex vai além. Apesar da saúde comprometida, prova ser suficientemente rústico para se dar bem na Trupe. Ele realmente espera morrer no super-tornado e assim dar algum sentido em sua vida. Mas sua aventura pode ser um pouco mais complicada. Sempre é.
Conheci Sterling pessoalmente durante a V InteriorCon, em Sumaré/SP. Um cara muito simples e acessível, apreciador de churrasco e caipirinha, e acho que Alex é uma espécie de alter-ego dele. Sterling, como seus personagens, vive em deslocamento, cada hora num país diferente – quando esteve no Brasil, por exemplo, estava vindo de um temporada na Rússia. Apaixonado por culturas exóticas, aproveita para colocar essa rica experiência em sua literatura, o que acabou por caracterizar também o movimento cyberpunk como um todo. Ler Sterling acrescenta camadas de entendimento sobre o que vem a ser o cyberpunk, que vai muito além de jargão techno, brutalismo e óculos espelhados.
Sterling conta histórias que se passam no futuro, mas ele é tão próximo que nem chega a ser fantástico. Fala de coisas que estão no nosso dia-a-dia, que vemos ao nosso redor. Há seres humanos de verdade nas suas histórias, em situações que poderiam estar acontecendo com a gente. Bolas, algumas das coisas que ele conta realmente aconteceram comigo, tal e qual!
Tempo fechado é uma história no seu tempo certo, colocando em debate a nossa responsabilidade coletiva, ou a falta dela, no cuidado com a natureza, o meio mabiente e o próprio homem. Afinal de contas, o tal supertornado pode até não acontecer, mas sabemos que a realidade sempre supera a ficção.
O que você pode fazer a respeito agora?

Um comentário:

  1. Está uma resenha muito boa, Cesar. Gostei especialmente destas linhas: "Ler Sterling acrescenta camadas de entendimento sobre o que vem a ser o cyberpunk, que vai muito além de jargão techno, brutalismo e óculos espelhados." Repassei o link para o pessoal da Devir, que te deve um agradecimento. E pra quem não sabe, a V InteriorCon aconteceu em outubro de 1997. Sterling foi o Convidado Internacional, e André Carneiro o Convidado de Honra. Em 1990, na I InteriorCon, Orson Scott Card foi o Convidado de Honra.

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